Analyses & Etudes
Regulamento de Acesso à Energia nas Zonas Fora da Rede
Regulamento de Acesso à Energia nas Zonas Fora da Rede
Gisela Graça (CGA)
No âmbito das reformas em curso no sector eléctrico em Moçambique, entrou em vigor no dia 24 de Janeiro de 2022 o Regulamento de Acesso à Energia nas Zonas Fora da Rede (doravante, o “Regulamento”), aprovado pelo Decreto n.º 93/2021, de 10 de dezembro. Este Regulamento visa reforçar o actual quadro legal do sector de energia, regulamentando as actividades de fornecimento para acesso à energia nas zonas fora da rede, com vista a impulsionar o uso produtivo de energia para acesso universal a este recurso e o consequente desenvolvimento sócio-económico do país.
As actividades de fornecimento previstas no Regulamento são de interesse público e de natureza social, revelando a intenção de se afastar a aplicabilidade do regime da Lei 15/2011, de 10 de Agosto, relativa às parcerias público-privadas, projectos de grande dimensão e concessões empresariais (“Lei PPP”). A nova Lei da Electricidade, actualmenteem discussão no Parlamento, deverá esclarecer em definitivo esta questão do afastamento da aplicabilidade do regime da Lei PPP.
São abrangidas pelo Regulamento as actividades de fornecimento de energia eléctrica (produção, distribuição, comercialização e armazenamento) nas zonas fora da rede, através de mini-redes até 10 MW e de serviços energéticos (por exemplo, sistemas solares autónomos), privilegiando o uso de fontes de energia renovável.
Estas actividades estão sujeitas ao pagamento da taxa regulatória, cujos termos e condições serão definidos pela Autoridade Reguladora de Energia (“ARENE”).
Mini-redes. Os projectos a serem desenvolvidos no âmbito deste Regulamento devem enquadrar-se dentro do plano de electrificação das zonas fora da rede que vier a ser aprovado pelo Conselho de Ministros, o qual definirá as áreas destinadas às mini-redes. O referido plano de electrificação será elaborado tendo em consideração o Plano Director Integrado de Infra-estruturas de Electricidade 2018-2043 aprovado em 2018.
Os empreendimentos de mini-redes estão sujeitos a concessão, a qual é, por regra, atribuída mediante concurso público e por um prazo máximo de 30 anos, sendo o processo tramitado pela ARENE.
O Regulamento classifica as mini-redes em três categorias: Categoria 1 (1.00 MW – 10MW), Categoria 2 (151kW – 1 MW) e Categoria 3 (até 150 kW). As instalações de Categoria 3 estão isentas da obrigação de obtenção da licença de estabelecimento e da licença de exploração.
O Regulamento prevê a obrigação do concessionário prestar uma garantia de desempenho para a fase de construção até ao início da operação comercial, no valor máximo de até 5% do valor do investimento, a favor da ARENE.
De entre outras obrigações, note-se que o concessionário deve iniciar a construção da instalação eléctrica dentro do prazo máximo de 18 meses e iniciar a operação comercial no prazo máximo de 36 meses (para mini-redes usando qualquer fonte de energia) ou 48 meses (no caso das mini-hídricas), contando todos os prazos a partir da data da emissão do visto do Tribunal Administrativo.
Note-se igualmente que o concessionário deve assegurar a expansão da mini-rede dentro da área da concessão, em função do crescimento da demanda.
O Regulamento prevê ainda algumas obrigações do concessionário relativas à implementação de conteúdo local, com foco para os residentes e comunidades do local do empreendimento, nomeadamente: (i) emprego; (ii) formação técnico profissional; (iii) transferências de conhecimentos e tecnologias; (iv) oportunidades para empresas locais de fornecimento de bens e serviços.
No caso de expansão da rede eléctrica nacional até a área de concessão de uma mini-rede, o Regulamento assegura a protecção do concessionário, competindo nomeadamente à ARENE regulamentar e monitorar: (i) as condições de interligação; (ii) os contratos de interligação e de compra e venda de energia eléctrica, respectivas tarifas e preços; (iii) as condições aplicáveis à determinação do valor da indemnização a pagar ao concessionário pelos activos da mini-rede.
O Regulamento prevê, entre outros, a aplicação dos seguintes princípios tarifários aos empreendimentos de mini-redes: (i) recuperação dos custos; (ii) retorno razoável sobre o capital investido; (iii) estabilidade das tarifas; (iv) partilha justa entre o concessionário e os seus consumidores finais, dos resultados do impacto de incentivos e benefícios fiscais e regulatórios, bem como das economias de escala e de ganhos de produtividade.
Serviços energéticos. A prestação de serviços energéticos deve privilegiar o uso de fontes de energia renováveis e abrange o fornecimento, financiamento, instalação, operação, manutenção de equipamento e instalações eléctricas, incluindo sistemas autónomos (nomeadamente sistemas solares domiciliares).
A prestação de serviços energéticos está sujeita a registo junto da ARENE, o qual tem a duração de 5 anos, prorrogáveis.
Os preços dos equipamentos dos serviços energéticos devem ser aprovados pela ARENE.
Compete à ARENE acompanhar, fiscalizar e controlar o cumprimento das condições da concessão de mini-redes e do registo de serviços energéticos.
Algumas das matérias previstas no Regulamento serão objecto de regulamentação.